Pular para o conteúdo principal

O populismo


O populismo é fundamentalmente uma forma de retórica politica e social que utiliza como mote a luta contra o favorecimento de elites ou pequenos grupos face à generalidade da população para assim conquistar visibilidade e atingir o poder. É também por isso uma forma de poder e governo.

O primeiro grande exemplo clássico é provavelmente o grupo do senado Romano "Os populares", de onde emergiram Júlio César e mais tarde César Augusto que com mestria, popularidade no exército primeiro, e na população de Roma depois, retiraram o poder ao senado e aos republicanos acabando por fundar o Império que lhes sucedeu.

O populismo na Europa, foi assumindo várias formas, desde o clássico "dar voz ao povo" em oposição ao paternalismo aristocrático, a reforma do Cristianismo retirando à elite eclesiástica o estatuto privilegiado que teve durante séculos, e até em sentido oposto, marginalizou elites culturais e económicas sobre a forma de conservadorismo rural.

As manifestações de teor populista, aconteceram um pouco por toda a Europa no século XVIII e XIX,  resultando no renascimento das ideias populistas clássicas dando origem a revoluções e violentas guerras civis.

Em França a revolução abriu caminho a Napoleão que teve uma profunda importância na difusão de princípios populistas que se enraizaram por onde passou. Apesar de derrotado e do regresso de muitas das antigas monarquias, de modo geral ficaram quase todas irremediavelmente enfraquecidas e a prazo perante uma nova realidade social.

A 1ª guerra mundial teve várias origens, questões de domínio colonial, movimentos independentistas dentro da própria Europa, mas fundamentalmente em novas mentalidades populistas que cresceram em oposição a regimes totalitários de classes aristocráticas em clara decadência.

As democracias modernas na Europa, só se estabeleceram verdadeiramente após o fim generalizado das grandes monarquias no final da 1ª guerra mundial. Nalguns casos só mesmo depois da 2ª guerra mundial e da queda dos regimes fascistas.  No caso do bloco soviético comunista, só mesmo depois da queda do muro de Berlim em 1989.

Fundamentalmente depois da 2ª guerra, as ideias populistas tiveram eco também nas colónias dos países europeus e rapidamente deram origem a movimentos e guerras de independência, geraram na sua esmagadora maioria novos estados de poder populista. Muitos ainda hoje não conseguiram estabilizar socialmente.

O populismo, numa fase inicial gera sempre uma enorme incapacidade de organização e muita convulsão social, pois qualquer tentativa de tomada do poder pode ser logo apelidada de anti-popular e de imediato destruída. Lembro-me de um comercial de televisão a uma marca de vodka Russa, muito elucidativo: um revolucionário de espada em punho entrava na sala de um aristocrata e matava-o com um golpe certeiro,  sentava-se para beber um copo do dito vodka deixado sobre uma mesa... mas pouco depois entrava uma nova vaga revolucionária e apanhava-o no acto, tomando-o pelo aristocrata e a cena repetia-se.

O populismo é então, chegado ao poder, a forma de poder mais disruptiva da sociedade. Chegando de forma pacifica ou violenta tem como efeito o desmantelar completo de toda a organização política e social, sem fornecer qualquer solução imediata para a reorganização. Isto porque o poder é discutido nas ruas e não em nenhum golpe palaciano, ou entre exércitos organizados.

Os resultados de uma revolução populista raramente são positivos pois geram períodos alargados de caos, pobreza e fragilidade social. São muitas vezes utilizados como meio para instaurar novas formas de poder absoluto de base populista que surgem depois como a salvação milagrosa para o caos instalado.  Os exemplos da Alemanha e da Rússia são evidentes mas repetem-se ainda hoje um pouco por todo o mundo.

Recentemente o populismo tem novas faces, já não procura só o poder total. Antigamente a procura da visibilidade e da disrupção social eram meios para conquistar (ou pelo menos destruir) o poder político. Hoje assumem em muitos casos, objectivos de sucesso pessoal e económico mais até do que político.  Veja-se o caso da comunicação social de orientação populista que não serve outro interesse em muitos casos que não o seu próprio sucesso ou até de figuras públicas que para promoverem o seu sucesso comercial dão eco a opiniões e ideias de teor populista.

Havia um mito de que com a partilha em massa de informação a sociedade evoluiria e cada vez menos haveria espaço para o populismo que quase destruiu o mundo várias vezes. É de facto um mito porque informação não é conhecimento e pode ser manipulada por interesses populistas.  Os riscos de ontem continuam vivos hoje e com o paulatino desaparecimento da memória das últimas guerras, cada vez mais perigoso se torna o mundo.

A preservação da memória é fundamental. Como George Santayana, escritor e filósofo Espanhol escreveu: "Quem esquece a história, está condenado a repeti-la".

Comentários

  1. A grande quantidade de (des)informação, faz baixar a qualidade média de quem a cria e de quem a consome...

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. A liberdade vem sempre com um preço a pagar. Mais, muitas vezes não é melhor, mas o fundamental é manter o sentido critico e saber escolher a informação antes de a tentar transformar em conhecimento.

      Excluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Presunção de culpa

Como se sabe, nos estados de direito ocidentais, há um principio de separação de poderes que isola os poderes executivo, legislativo e jurídico. Um quarto poder, não oficial e ainda mal regulado, nasceu com a comunicação social. Se nos três poderes de estado, as regras estão bem definidas e são relativamente bem respeitadas, a comunicação social, dada a sua vocação fundamentalmente privada, dispersa e sujeita ao mercado, tem mais dificuldade em ter uma intervenção tão balizada. Os dias, são de dificuldade e aperto para a comunicação social, que está com muitos problemas em se adaptar aos tempos de massificação da informação. Surgem até apelos de quem quer ver o estado intervir. Espero que o estado não ceda a essa tentação pois seria, por certo, o principio do fim da comunicação social independente. Entrando agora no tema fundamental deste artigo, alguma comunicação social, além de não ter grandes preocupações deontológicas, de ter esquecido o que são notícias, de sacrificar os p...

Raison d'être

Hoje resolvi comentar o estado da comunicação social à qual de muitas formas tenho estado sempre ligado. No século XIX, mas principalmente no século XX, a comunicação social e acima de tudo o jornalismo que não é bem a mesma coisa, tornaram-se no muito falado quinto poder. Fizeram terminar guerras, cair governos e governantes, ajudaram a desmascarar criminosos, ajudaram a formar uma moral colectiva moderna e a criar a idade da informação. Acima de tudo fizeram o mundo mais pequeno e humano, trazendo para dentro deste novo mundo uma grande parte da população que antes estava ostracizada. No século XXI, a informação ganhou vida própria, independente de meios institucionais. Cada um de nós está a um "click" de comunicar para o mundo. A comunicação social tem tido uma tremenda dificuldade em se adaptar a este novo fenómeno. Luta diariamente com quem não tem os mesmos objectivos, as mesmas causas, com quem não tem até quaisquer valores morais. Com quem não tem sequer de res...