A individualidade é essencialmente a capacidade de nos vermos de forma independente e única perante os demais. Pode ser real ou uma mera ilusão criada pela nossa mente na interpretação do que nos rodeia, vários argumentos apontam em direcções opostas, a história humana e a biologia oscilam entre o individual e o comum.
Na actualidade, a ideia de individualidade no mundo ocidental, parece ganhar terreno à visão mais colectivista que ainda está enraizada na cultura oriental. Mesmo os interesses colectivos do mundo ocidental, servem em última instância a preservação da individualidade. As leis, a economia, a organização social e a cultura são fundamentalmente organizadas sobre o individualismo, sobre o que nos faz diferentes. A aceitação do que é diferente é quase uma obsessão social e aos olhos da generalidade, uma prova de civilização e urbanismo.
Por oposto, no antigo bloco soviético, resultante da centenária revolução russa, tentou-se implementar uma sociedade colectivizada. Nunca conseguiu competir economicamente com o desenvolvimento da sociedade ocidental e acabou por colapsar. Os valores muito tentadores do individualismo invadiram as sociedades da Europa de leste, tornando completamente irreversível o fim da colectivização. O mesmo está a passar-se no extremo oriente e um pouco por todo o mundo.
Historicamente, a humanidade organizou-se sempre em pirâmides sociais. Alguns tinham muitos direitos e os restantes só os podiam exercer de forma limitada. Mesmo na Grécia clássica, a ideia de igualdade era colectivista e acima de tudo uma visão de obrigação citadina (das cidades estado) que defendia o bem geral acima do bem individual, a obrigação perante o colectivo acima da individualidade.
A primeira ideia generalizada de individualidade genuína, nasce com o movimento do romantismo (aconselho a consulta do artigo sobre a originalidade onde esta ideia é mais desenvolvida), onde pela primeira vez se valoriza e glorifica o "eu" interior, a diferença do próximo, o sentimento individual. O individualismo é a forma mais extrema de pensamento que nasceu deste movimento, nenhuma sociedade de hoje é estritamente baseada no ego individual de cada um, embora vários movimentos anarquistas o tivessem como objectivo, seria muito difícil manter uma organização sem quaisquer obrigações ou sentido colectivo.
A nível politico, a mistura de individualismo com ideias base de organização deu origem a valores nacionalistas, liberais, socialistas e até à democracia cristã europeia. Alguns valores colectivos, como a ordem pública, a protecção social, e até religiosos misturaram-se com a defesa do direito individual dando origem ao mundo ocidental moderno.
Na arte e mais recentemente no desporto, a glorificação do individualismo na forma de originalidade (mais uma vez aconselho o a leitura artigo sobre originalidade) é talvez a maior das suas contradições: a admiração, o seguidismo, o endeusar de um individuo que se sobrepõe à nossa própria individualidade.
O individualismo, tem como uma das suas principais fundações a privacidade e a escolha de como e quando partilhamos a nossa intimidade. Leis, valores sociais e éticos estão profundamente enraizados em cada um de nós de forma a preservar a individualidade como valor.
O século XXI, trouxe a massificação da informação e da comunicação. De uma forma quase imperceptível, paulatinamente a nossa privacidade parece estar a desaparecer. O estado e as grandes corporações competem por informação de cada um de nós. Mais, estamos a voluntariamente partilhá-la de formas que há duas ou três décadas atrás seriam complemente inimagináveis.
Imaginar um futuro sem privacidade parece agora possível, provável, quase inevitável. Isto leva-nos mesmo a antecipar que a própria individualidade pode estar a esbater-se, que caminhamos para a ubiquidade do pensamento dentro de uma colmeia humana, partilhando tudo sobre todos ao mesmo tempo. Será ficção ou o nosso real destino evolucional?
Como disse Joseph Campbell: "Temos de nos livrar da vida que planeamos para aceitarmos a vida que nos espera".
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